Literatura-53.O tálamo...

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Antes de abrir os olhos senti uma mão macia e carinhosa, segurar a minha. Sabia quem estava ali. Abri os olhos e a vi sentada na borda da cama de hospital . Ísis segurava minha mão e em seu rosto transparecia a ansiedade, em esperar de mim um sinal de consciência.--Onde você estava quando ocorreu o assalto?--Depois eu conto...agora falemos somente de coisas banais, para ajudar na sua recuperação.--Qual foi o estrago comigo?--Três balas. O médico disse que você teve sorte,todas passaram sem causar muitos danos. A da coxa não pegou o osso nem a artéria. A da barriga passou reta. E a da cabeça passou de raspão,ocasionando uma pequena trinca no osso do crânio , não ofendendo por dentro.----Disse ela com carinha de dó.--É... parece que tenho sorte mesmo. Faz tempo que você está aqui comigo ?--Fui eu quem o trouxe aqui. Desde então não o tenho deixado só.--Obrigado...mas vou querer um explicação sobre onde você estava ontem a noite.--Já disse, que depois explico. Agora você precisa descansar.----Mediante a firmeza incomum que via nas palavras dela, resolvi obedecer. Ademais não estava em condições de discutir nada mesmo. Acordei uma segunda vez e parecia ser um outro dia. Ìsis continuava a meu lado , somente se afastando um pouco quando alguma enfermeira vinha me dar medicamentos. Já estava bem disposto e sentia minha perna esquerda enfaixada na altura do fêmur. O clarão do dia,na janela envidraçada do hospital,atravessando a cortina clara, não definia as horas. Não tinha noção de que lado era o norte ou o leste.--Bom...conte-me agora o que você tem que me contar. Já estou bom e com as ideias no lugar.----Disse com firmeza para a moça que olhava pela janela através da cortina. Ela se movimentando devagar, pegou um pequeno espelho em uma mesinha e se dirigiu até a cama. Pensei no primeiro momento que iria mostrar minha cara,que com certeza estava meio estragada. Mas ao contrário,direcionou o cristal para baixo da cama, em um ângulo que deitado pudesse ver aquele sitio. Consegui ver de relance o que parecia ser uma mão grande e escura.--O que é isso? ----Perguntei já antevendo a resposta.--É um homem morto.----Disse tranquilamente sem nenhuma emoção.--O que faz ele, aí? Porque está aí? ---Já meio nervoso.--Ele veio para terminar o serviço que o outro não deu conta. Falando conforme nos filmes.---Senti um arrepio na espinha ao perceber a situação crítica em que estava. Lembrei-me que antes de o bandido atirar em mim, disse qualquer coisa sobre cumprir ordens.--E agora o que vai fazer com ele?--Quando anoitecer , dou um jeito.----Disse ela tranquilamente.--Que horas são?--Quatro e meia da tarde.--E quando me vão dar alta?--O médico disse que amanhã a tarde o libera.--Nossa... não sei se vou aguentar ficar aqui exposto, esperando. Certamente que na falta deste aqui, vão mandar outro.--Não se preocupe, eu estou aqui. Até agora o vigiei muito bem.--Certamente, eu muito a agradeço mas ainda quero saber onde você estava na noite do assalto.--Quer saber mesmo ? Você não vai gostar nem um pouco.----A claridade na cortina esmaecia, denunciando o fim da tarde. Me incomodava também, saber que estava deitado sobre um defunto.


 Era encrenca que não se acabava mais. Não entendia porque os problemas apareciam de graça em minha vida. Quando parecia que tudo corria bem , de repente acontecia alguma coisa. Sempre algo inesperado e chocante. Ainda não sabia da Valdívia. Porque não tinha aparecido no hospital?Sera´que fora sequestrada? Muitas dúvidas pairavam em minha cabeça mas o mais urgente era a explicação de Ísis.--Há muito tempo que venho sendo assediada pelo Fidélio. Procurei ignorar, até que antes de ontem ele me pôs em uma situação difícil.Foi tipo uma chantagem , imagino.----Eu escutava com os pensamentos remoendo dentro da cabeça, mas aguardava com paciência o desfecho e já tinha certeza o que seria. Porem estava enganado.Ele se achegou em um momento que você estava no banheiro e a moça na cozinha e me impôs encontrar com ele, o que seria ontem. Disse que era um caso urgente e que sua vida estava correndo perigo. Não havia meio de falar ali perto de todos, daí irmos para um lugar seguro .Eu sem saber do que se tratava assenti. Mas depois que já tinha saído de casa e estava com ele comecei a analisar a situação de uma forma mais racional. Muitas perguntas tinham que ser feitas e as informações primeiras, não convenciam .Quando chegamos em nosso carro, em um lugar ermo e escuro, ele mandou parar e logo começou a me atacar de todos os lados. Queria mais agir do que falar. Deixei rolar por um momento, imaginando se não estava me tornando uma humana de verdade. Antes que a coisa ficasse incontrolável dei um stop. Daí comecei a apurar o porque que ele queria se encontrar comigo. Com a maior cara de pau, ele disse que simplesmente queria usufruir de minha beleza, longe de você. Perguntei sobre o que me tinha dito na noite anterior, a respeito de risco de morte etc.Disse que era somente balela para me trazer para o esquisito. Fiquei irritada e liguei o carro para retornar. Já estava com medo que tivesse caído em um esquema criminoso e que você estava sem proteção. Ele quis me deter usando de força, mas logo percebeu que a coisa não era como pensava. Inteligente se pôs em seu lugar e ficou quietinho o caminho todo de volta. Pouco antes de chegar em casa ele pediu para descer em um posto de combustível. Parecia um pouco assustado. Eu preocupada com você, acelerei para chegar mais rápido. Quando cheguei em casa, foi que vi a besteria que tinha cometido. A porta de baixo estava aberta, e na sala, você jazia desmaiado. Pedi imediatamente uma ambulância.--E a Valdívia, não a viu? Ela estava lá comigo. Ela, esperando o Dom Juan e eu esperando você.--Não havia ninguém no apartamento a não ser você, deitado de costas ao lado do sofá. E antes que você comece a me pichar, digo mais uma vez, que a coisa não passou de uns amassos.--Acredito nisso...E no mais quem sou eu para exigir fidelidade?Como a maioria dos homens não passo de um crápula machista,cafajeste e sem-vergonha.--Então parece que estamos conversados. Agora vamos tratar de pensar e tentar descobrir quem nos roubou. Em uma primeira instância , acho que o Fidélio e a moça estão envolvidos nisso.--A moça ?Como assim?--É fácil...ele conquistou a confiança dela e ela passou as informações sobre suas economias , onde ficava seu cofre, etc. Talvez esteja errada, mas podemos começar por aí. Vamos encontrá-la, dar um aperto e depois a gente pega ele. E tem que ser rápido , antes que troquem todo o dinheiro. Você consegue se lembrar das fisionomias dos que o assaltaram?--Acho que sim...--Ótimo. Vamos conferir com as fichas da polícia.--Polícia? Vamos mexer com eles? Podem ser que até estejam envolvidos. Nossa polícia é corrupta igual ao governo. Não se pode confiar em nada neste país.--Você vai ficar em casa, fechadinho, sem se preocupar com nada, até se recuperar bem. Eu tomo todas as providências. Você ainda confia em mim?--Claro...sempre confiei. Você é o amor de minha vida.----Ouvindo isso ela se achegou com delicadeza e me beijou o rosto. Estávamos em paz.                                                 

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