Literatura - 25.O tálamo..

                                                                     25
Para mim, estava ótimo tudo aquilo. Via na amizade das duas algo cheio de candura e honestidade. À noite, na cama,quando das confabulações que todas as mulheres gostam, Eliza me contava os pormenores da vida de Joice. Passei, a saber, os mínimos detalhes do cotidiano da amiga. Quando víamos algum filme na TV ou algo de interesse, Eliza fazia um jeito de colocar Joice ao meu lado. Não sabia se era para me valorizar, ou no íntimo, não tinha ciúmes da outra. Eu ficava em numa boa e me sentia um sultão entre as duas. Talvez essa fosse à intenção de Eliza. Dentro de algum tempo, Joice precisou viajar para ver a mãe que estava doente. Iria ficar ausente por três dias. Pediu para Eliza ficar olhando a lojinha. Fez uma lista dos produtos a venda e dos respectivos preços, para facilitar a estadia de Eliza como vendedora. Isso para nos foi à grande oportunidade de visitarmos o banco do passado. Na primeira noite, levamos a cama até o local. A loja era na verdade uma casa onde o cômodo da frente fora modificado para se tornar comercio. O lugar calculado para pormos o tálamo seria o segundo cômodo depois da loja, um lugar onde servia de depósito. Subimos na cama mesmo sem o colchão e os forros, e acionei o controle para o tempo marcado. E lá fomos nós. No local era noite também, assim ninguém viu o nosso apuro. O lugar estava calmo e somente uma lâmpada mortiça clareava a ala dos caixas. Infelizmente a cama ficou entre um cômodo e outro. Uma enorme parede passava pelo meio dela e por cima de nossas pernas. Era uma sensação ruim estar com as pernas cimentadas, dentro de uma parede de quarenta centímetros de largura. Parecia que a construção fora feita com a gente dentro. Assim ficamos com o corpo do lado de fora do cofre e as pernas pelo lado de dentro. Eliza ficou branca e antes que tivesse um ataque de pânico, acionei nossa volta rapidamente. Chegamos ofegantes e demos um tempo para pensar melhor. Esperei a moça se acalmar e comecei a fazer os cálculos da mudança de posição do móvel, para ficar todo dentro do cofre. Uma ideia angustiante me ocorreu que, se porventura um dia ficasse com a cabeça presa dentro de uma parede ou coisa parecida, ou a própria mão segurando o controle, estaria perdido. Agitei a cabeça como se jogasse fora as ideias ruins e deduzi que arrastando a cama um metro e meio, ela ficaria totalmente dentro do rico recinto. Eliza já refeita do susto me ajudou a empurrar.

Como a área era pequena, tivemos que colocar a cama em ângulo, com os pés encostados na parede do depósito. Dessa forma, ficou inclinada. Certamente que do lado de lá do tempo, ela ficaria na horizontal. Penduramo-nos no móvel, se agarrando na estrutura da cabeceira e lá fomos novamente. Desta vez correu tudo bem. Sentimos ficar com nossos corpos em nível suavemente. Estávamos dentro do cofre. Começamos sem perda de tempo a vasculhar arquivos e armários. Adverti Eliza que o dinheiro deveria ser ignorado. Depois de algum tempo, encontramos o ouro. Tinha somente algumas joias e três barras pequenas. Fiquei um pouco decepcionado com o achado. Pensava encontrar muito mais. De repente, ouvimos um ruído. Era a porta do cofre sendo aberta. Com a pressa, subimos na cama com a carga preciosa. Ainda deu tempo de ver a frente da porta já aberta, um homenzinho de bigode fino e cabelo ensebado repartido ao meio, com óculos pequenos e redondos, e olhar estupefato. Parece que ficou paralisado ao nos ver por segundos, enquanto desaparecíamos em meio a um clarão. Deveria ser daqueles gerentes que dorme pensando no serviço. Perdeu o sono na madrugada e resolveu ir ate o estabelecimento, dar uma conferida no precioso local de trabalho. Ganha-pão por muitos almejado e só conseguido a duras negociações e influências políticas. Quando chegamos à loja da Joice, caímos da cama, com Eliza rolando por cima de mim, devido à inclinação. Depois de alguns minutos começamos a conferir o saque. Encontramos somente uma barra de ouro. Eliza me deu certeza que tinha carregado tudo.
----Então porque não chegou?---- Perguntei meio irritado
----Como vou saber? O engenheiro é você. ----Respondeu sem vacilar. Comecei a avaliar a situação e deduzi que a inclinação da cama fez as coisas caírem pelo caminho. Alguém no passado teria achado duas barras de ouro e algumas joias, do nada.

----Isso é que se chama de sorte verdadeira. ----Comentei com Eliza. ----A pessoa entra em casa e lá esta duas barras de ouro e joias, ao dispor, sem precisar apostar na loteria suspeita do governo, e nem comprar carnês de estelionatários legalizados.

Nenhum comentário: