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Certa
vez, em uma manhã de domingo, Joice estava em casa e Eliza queria ir
comprar alguma coisa para fazer o almoço. Ofereci-me para a tarefa,
mas ouvi um não convincente. Creio que eu não sabia comprar coisas
domesticas. Joice também se ofereceu de irem juntas, mas também foi
convencida que deveria ficar conversando comigo, era coisa simples e
rápida e logo estaria de volta. Depois que Eliza saiu, a outra veio
sentar-se ao meu lado. Eu meio desconfiado de tudo aquilo, fiquei
esperto. Tem horas que as mulheres são imprevisíveis. A manhã
estava fresca, mesmo sendo verão e as horas passavam tranquilas e
alegres. Do lado de fora se escutava o barulho de pardais. No meio da
conversa, a moça começou a passar a mão em meu braço. Tomei
aquilo como uma manifestação de amizade e continuei com o assunto.
Ela foi progredindo e de repente me lascou um beijo quente e
demorado. Enquanto eu ficava com cara de espanto, ela não se
intimidava e continuava a me dar um tremendo amasso, soltando por
cima de mim todo aquele corpão macio e cheiroso. Eu estava gostando,
mas também estava ligado na volta de Eliza. Esta quando chegou, veio
fazendo barulho, parece que propositalmente. Tomamos nossos lugares
como bem comportados.
Eliza entrou com coisas nos braços e ao
passar pela gente brincou:
----Estão
namorando aí, é? Disse rindo.
----É...
Tomei emprestado de você. ----Disse outra, me encarando com olhos maliciosos. Por minha vez, fiquei calado, pois não sabia exatamente do
que se tratava. Poderia dar um grande fora e estragar tudo, que até
ali estava muito bom. Eliza permaneceu na cozinha e Joice ao se
levantar para ir ate lá, beijou a ponta do dedo e encostou este em
minha boca, insinuando uma despedida. Fiquei no sofá, meditando
sobre o curso da vida, onde às vezes se tem de menos e outras
demais. Há tempos de vacas magras e outros de vacas gordas.
Nesta
fase, nada tinha que reclamar. Só agradecer. Não estava rico, mas
estava feliz, bem amado e satisfeito, pelo menos era o que parecia,
naqueles dias alegres e agradáveis.
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Vez
ou outra procurava saber noticias do Aristides. Tínhamos que manter
certa vigilância no homem, por precaução. Eliza se passava por uma
amiga de trabalho e ligava em sua casa para saber das melhoras. Até
ali parecia que ia tudo bem, o individuo teria voltado a trabalhar na
empresa, embora tivesse um apagão de memória com coisas mais
recentes. Outra vez, em um supermercado, encontrei um velho conhecido
que era também um colega da “Açobom”. Entre um assunto e outro,
perguntei do chefe, como se nada soubesse.
----Você
não soube? Sequestraram o homem que ficou desaparecido durante cinco
dias.
----E
mesmo? ----Disse, mostrando surpresa pela noticia. ----Não fiquei
sabendo. E agora como ele está?
----Já
voltou ao trabalho... Você precisa ver... É outra pessoa. Ficou um
pouco retraído, fala mais devagar, enfim, melhorou bastante.
----Que
bom... ---Disse eu. Fiquei satisfeito com as novidades. Ele que
tocasse a vida, contanto que não interferisse mais na minha, estava
tudo ótimo. Parecia ao fim de tudo, que na verdade eu fizera um bem
ao individuo em vez do mal. Tudo que seja feito para aperfeiçoar o
ser humano, tem que ser encarado como benefício. Assim penso eu na
minha ignorância. Ate hoje, acho que ele causou mais estrago em
minha vida do que eu na dele. Mas hoje já vejo as coisas de uma
maneira diferente e consigo analisar por outros ângulos. Não sei se
são as amarguras que nos causam isso, ou é o aperfeiçoamento do
espírito durante o passar dos anos. Mas qualquer coisa que seja,
colabora para nosso bem. Depois de tudo, ficamos lembrando como se fosse uma
velha peça de teatro, ou um filme há muito tempo assistido.
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