Uma homenagem ao Zuza.
Eu o conheci desde criança.Ele era um dos irmãos Siqueira.Era humilde, trabalhador e honesto.Morava em uma casinha simples,baixa, quase no fim da rua Siqueira Campos, ja fazendo divisa com o terreno do Chino Pereira.A casa de meu pai ficava mais abaixo uns cinquenta metros.
De vez em quando eu ia com meu irmão passear a casa dele. Era bom de conversa e nos tratava sempre bem.Calmo,mas nunca nervoso.Aceitava as brincadeiras de outros de forma natural e alegre.Alí ele morava com sua esposa Anésia e suas duas filhas ainda crianças.
Era membro da igreja presbiteriana e frequentava a chácara de meu avô aos domingos.Lá, além das conversas e da fartura do leite e das pamonhas nos tempos de milho,tinha também na grande sala, uma variedade de jogos.Jogava-se peteleco,burrica,damas e dominó.
Parecia um clube dominical a chácara de meu avô.Todos os parentes compareciam após o almoço e o Zuza também.Zuza era o apelido carinhoso que todos o chamavam.Seu nome de registro era João José Siqueira.Era querido pelo povo e conhecido na cidade inteira.
Nos domingos na parte da tarde, saindo da casa de meu avô, geralmente íamos a um culto de propaganda (Assim era chamado) em algum sitio próximo.Iam todos a pé, onde os grupinhos iam conversando em uma espécie de procissão sem fila.
O Zuza gostava de cantar e soltava a voz a todo volume nos hinos entoados, com alegria e entusiasmo.Aquele tempo foi a era de ouro da igreja presbiteriana.A igreja era frequentada por todos os filhos do Américo.O Zuza sempre estava lá como uma presença marcante.
Se por acaso não aparecesse ja despertava um clima de preocupação.Poderia estar doente.O seu trabalho também era o mais humilde.Enquanto seus irmãos trabalhavam como escriturários na prefeitura ele trabalhava na coleta de lixo.Aquele tempo era feito com uma carroça.
Uma mula socegada a puxava e ja tinha prática as ordens do Zuza.Ele com uma pá na mão esquerda e uma vazzoura em outra,ia recolhendo papéis,latas, caixas, estrume de cavalo e tocos de cigarro, jogados na rua de terra empoeirada.De chapéu de palha grande e roupas remendadas,quase não dava para o conhecer de longe.Mas no domingo havia uma transformação.
Aparecia na escola dominical bem arrumado com paletó, gravata e sapatos engraxados.Quando voltei morar na cidade, ele ainda trabalhava na prefeitura mas fora promovido a jardineiro.Amava seu trabalho.Mesmo a noite, olhava a praça depois do culto aos domingos.
Sua tarefa era evitar que agroboys sentassem no encosto dos bancos, com as botas no assento e crianças subissem nos canteiros bem cuidados.Certa vez,foi instalado um conjunto de postes doado por uma benfeitora chamada Marlene.Eram postes estilo colonial ,que imitava um tipo de luminária antiga.
O poste era metálico e abaixo do suporte da lâmpada, ficava a bôca do tubo de sustenção do conjunto.Depois de alguns anos começou a aparecer na praça um cheiro forte de putrefação que aumentava a cada dia.O povo ja estava evitando atravessá-la.
Foi o jardineiro Zuza que descobriu que os postes de iluminação se tornaram um cemitério de insetos.Eles chegavam atraidos pela luz noturna e iam caindo dentro do tubo dos postes.Depois vinha a chuva e molhava tudo aquilo, formando uma fermentação terrível.Uma outra habilidade que possuia era com a eletricidade.
Fazia consertos e instalações elétricas.Certa vez, meu irmão que era muito malvado,na sapataria do Tonico Boi, colocou uma moeda no soquete de uma lâmpada.Quando as 18 hs ligaram o motor da luz, queimou um fuzivel da sapataria.
Nessa época o Zuza morava quase em frente. Mais do que depressa o chamaram.Meu irmão ficou só observando como se fosse um dos curiosos que se reuniam nessas horas.O Zuza foi diretamente na lâmpada e desrosqueando-a tirou a moeda causadora do curto.
Futuramente foi acometido de um mal cardíaco.Talvez causado pelo fumo,coisa que nunca coseguiu se livrar, mesmo sabendo que um crente não deve ter hábitos maléficos a saúde.Êsse era o seu ponto fraco, mas ninguém se importava nem o cobrava.
Quando a doença se manifestou mais intensa ele se mudou para Itapetininga. Lá estaria mais próximo de médicos e o tratamento seria mais efetivo.Uma das últimas vezes que fui a Guareí, ao cemitério, ví seu túmulo junto com os de seus irmãos.Formavam uma fila um ao lado de outro.
As pessoas se vão mas,ficam em nossas mentes as cenas de sua vida e em nosso coração sua história.Com o Zuza foi assim.Na humildade e simplicidade conseguiu deixar gravado em nossas lembranças a sua bondade e seus feitos.Hoje certamente está cantando no coro celestial o hino "Um pendão real", que tanto gostava.
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