Literatura- 29.O tálamo...

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Estávamos no cômodo onde ficava a cama. Com o controle na mão, me preparava para acioná-lo e trazer o tálamo de volta. Como prevenção, ficamos um pouco afastados e atrás de um móvel,longe do suposto lugar vazio, onde estava a cama. Apertei o controle... O cômodo clareou com o flash... E veio também a cama. Respirei fundo e fui até o móvel para conferir. Estava tudo normal. Passamos o resto do dia agitados pela alegria de termos nossa máquina de volta. Nem passou pela nossa cabeça o fato de que os alienígenas pudessem voltar novamente para reclamar. Na noite desse mesmo dia, acordei com os elementos estranhos a volta de nossa cama. Tentei reagir, mas percebi que estava totalmente paralisado. Só conseguia mexer com os olhos. A gente deitado de costas, sem poder virar a cabeça,o campo visual fica limitado e pequeno. Parece que mexiam em minha barriga, mas não dava para ver nada. Nada sentia também. Lembrei de Elisa e olhei para o lado onde ela estava.Pelo ângulo estreito da visão ví que alguém também a examinava, mas mesmo forçando a vista não conseguia ver onde eles a tocavam. Estávamos a mercê do inimigo.



 Lembrei que deixei o controle da máquina dentro da gaveta do criado mudo.Depois de uma longa sessão de exames (Supunha eu),liberaram nossos movimentos e nos puseram em pé. Eu e Eliza encostados na parede,totalmente nús. Três figuras mais parecidas com sombras que com seres vivos, estavam a nossa frente. Um se adiantou para o nosso lado, apontou o dedo em direção a minha cabeça. Veio um pensamento acompanhado de uma imagem, do controle que estava no criado mudo. Agindo como um robô e contra a minha vontade, fui devagar até o criado mudo e apanhei o controle. Um deles se aproximou e pegou de minha mão a preciosa chave que abria as portas dos mundos. Minha respiração ficou difícil mediante a situação de perda. Em seguida, viraram as costas para nós e se dirigiram para a cama em outro quarto. Um minuto depois estávamos somente eu e Eliza no cômodo, pelados, olhando um para outro. Eu, satisfeito por ainda estar vivo, com os movimentos voltando devagar. A moça também se mexia lentamente.
----Desta escapamos. ----Disse eu, referindo ao perigo passado.
Ela, muito assustada, tentava pegar suas roupas no chão.
Quando a voz voltou, mais calma, foi se vestindo e falando:
----Como você consegue ficar tranquilo mediante uma situação dessas?Você deve ter um problema psíquico para agir dessa forma.Não é normal.
----Já estou me acostumando com as agruras da vida. E na verdade, a tranquilidade é só aparência. Estou bem nervoso também.
----É, mas não parece nem um pouco. ----Insistiu.
----Também fui treinado para isso. ----Falei como se fosse dono de uma vantagem. Ela acertando os botões da blusa, fez uma expressão de descrédito. Passada a tensão, conformados com os acontecimentos, resolvemos de comum acordo esquecer tudo aquilo, já que a turma não voltaria mais por ali. Pelo menos nada tinha que os interessasse.
----E se implantaram alguma coisa em nossos corpos?Poderiam voltar para conferir. ----Disse a moça apreensiva.
----Talvez... Mas acho que foi somente um exame superficial. As informações que queriam já pegaram. Viram a diferença entre um homem e uma mulher etc.
---Não sei como você consegue em uma situação destas, fazer piada.---Falou irritada.
---Não é piada, não...vi muito bem eles a examinarem e comigo foi a mesma coisa. Somente por curiosidade é que eles não fariam isso. Parece que em certos quesitos, são meio burros. Um ser humano, enquanto a gente estava paralisado, reviraria todo o aposento para encontrar o controle. Eles não...me fizeram entregar de mão beijada.
--- E diga-se de passagem que foi bem mais fácil. Não vejo nada de burrice nessa gente. Estão muitos anos luz a nossa frente.---Respondeu a moça, acabando com o assunto e com minhas teorias.Discutir com mulher irritada é muito difícil.
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 Senti muito a falta da cama. Quando a levaram, junto foram nossos planos e nossos sonhos. Continuamos nossa vida, vendemos o ouro e repartimos o dinheiro. Eliza colocou a parte dela em um banco para render juros. Eu fiz o mesmo, mas depositei o dinheiro em outro banco. A vida tinha me ensinado que as pessoas mudam. Não havia desconfiança entre nós, mas uma resistência de minha parte em me envolver totalmente. E no mais, nosso compromisso era verbal. Poderia acabar de uma hora para outra, sem maiores complicações. Eu já estava enjoado com repartição de bens e coisas do gênero. Talvez nem tanto pelo material mas ,mais pela angustia de se perder alguém de quem se gostava. A proximidade da casa de Eliza com a de Joice, nos possibilitava incrementar a liberdade de ir e vir a qualquer momento, entrando e saindo da casa de outro, como se fosse uma extensão de nossa própria residência. Às vezes Joice nos pegava de surpresa, meio pelados, o que para as duas parecia perfeitamente normal e motivo de risos. Para eu que tinha uma mente mais fechada sempre estranhava certas coisas. Aos sábados à tarde, ficávamos os três na loja, conversando e tentando ajudar à amiga.

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