Demissão rápida



















 Dizem que o passado de nada vale a não ser as lições que
a gente aprendeu.Não se pode modificar nem alterar, fatos
estagnados no tempo.  Só servem para recordações e
análises.Mas as lições que a gente aprendeu, muitas delas
nunca esquecemos.

E quando vamos ficando mais velhos, parece que elas (as
memórias)sempre vem a tona como se fosse uma serie de
tv, em capítulos.Hoje acordei lembrando de uma empresa.
Foi a terceira em que trabalhei na década de 60.Era uma
empresa Suiça com a matriz em Zurique.

O quadro de funcionários importados consistia de suiços
e alemães.Eles tinham um tratamento diferenciado pela
empresa e não se misturavam com a ralé, que eram nós,
os desenhistas.Tinha eu, o Darlei e o Caruso de brasileiros,
o seu Valentim (espanhol) e o seu Antonio (italiano).

Com estes a gente se dava bem, íamos almoçar juntos e
ficava no bate papo após o almoço, esperando a hora de 
recomeçar o trabalho.O seu Valentim trazia marmita de
casa.Ele e o seu Antonio eram casados com brasileiras.O
gerente era um suiço-francês de nome Gerardine.Diziam
que era neurótico de guerra.

Tinha também o meu chefe , um alemão com um mau
hálito insuportável, e mais dois suiços, um com o esquisito
nome de Probst, cara alto e arrogante.Um outro mais novo
  que se esforçava para aprender o português, usava
barbicha e fumava cachimbo.

Essa turma mais os desenhistas,formava o quadro técnico
da firma.A gente almoçava em barzinhos na vizinhança e a
nossa turminha ia de um lado e os estrangeiros de outro.
Parecíamos água e óleo.A gente percebia uma discreta
discriminação.Olhando aquela gente, eu imaginava a Suiça
um lugar frio e sem graça.

A empresa ficava dos lados de Santo Amaro e para ir até lá,
eu saia de manhã de Sta Cecília, ia até o vale do Anhangabaú
onde pegava um ônibus.Descia um pouco antes de chegar a
Sto Amaro e andava um belo trecho a pé.Era uma descida
longa que atravessava um bairro chique e depois  passava
em frente a um seminário católico, onde os estudantes
jogavam futebol de batina.Era interessante ver os vultos
pretos se movimentando atrás de uma bola.

Certa vez emprestamos o campo para uma pelada sem
compromisso com o pessoal da firma.Foi a única reunião
social que tivemos em um ano. A minha permanência também
foi curta, não passando alguns dias disso.Já estava bem
prático com o sistema e o alemão me mandou fazer um
levantamento na Santista têxtil.

Tinha que ficar lá por dois dias. Depois de cumprida a tarefa,
quando retornei a firma o quadro já era outro.Deu uma
reversão na cabeça do gerente, que acabou  suspendendo o
alemão do trabalho,fazendo-o aguardar em casa até segunda
ordem.Quando cheguei, o gerente me chamou e queria saber
nos mínimos detalhes o que fui fazer na Santista.

Fui explicando com paciência todos os pormenores, desde
a hora que entrava na firma até a hora em que saia.Meio
assustado e apreensivo, não sei porque, eu respondia com
uma mão na boca.Ele gritou,para que eu tirasse a mão da
boca quando falasse com ele.

Naquele momento a irritação subiu em minha cabeça e
me considerando uma pessoa livre com meus movimentos,
retruquei no mesmo nível , que não tirava.A demissão foi
imediata.Se existe lugares onde se encontre gente estranha,
loucos e potenciais inimigos, são as empresas.


 
  

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