Literatura.11-O tálamo...

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Depois de algum tempo cheguei a algumas conclusões práticas. Ficando fora da cama para não ser envolvido, fui acionando o controle e vendo as reações. O triângulo do meio ligava o sistema. O da direita parecia que mandava o tálamo com quem estivesse em cima para o futuro. O da esquerda para o passado. E o de cima, retornava ao ponto zero, ou para o presente. No dia seguinte faria outra viagem, mesmo com um medo danado de se perder nas dobras do tempo. Pensava comigo que simplesmente “sumiria” e seria um caso insolúvel, como diz a policia. Sumir... Aquela palavra parece que queria se fixar de alguma forma em meus pensamentos, mas desviei a atenção para outras possibilidades. Pensei no imenso leque de opções. Estava ali a minha frente à melhor agenciadora de viagens que existia.... tudo grátis, livre das garras do capitalismo, mesmo que o risco fosse por conta do viajante. Peguei o controle e escondi-o no guarda-roupa. Temia que ao estar na cama pudesse ser acionado acidentalmente. Já pensou acordar outro dia junto com os leões? Se desse tempo de acordar. Por outro lado queria guardar o máximo de segredo daquilo tudo. Nem para Eliza, contaria. Razões para fechar a boca existiam aos montes. Se alguém soubesse, em pouco tempo cercariam minha casa, certamente levariam a cama a um lugar secreto. As noticias seriam bloqueadas e o mínimo que saberiam de minha pessoa era que estava envolvido com drogas ou coisa parecida, ou pior ainda, suspeito de ser um terrorista. Daí o governo dos EUA mandaria uma ordem , sugerindo que me deportassem para lá. Como o nosso governo quase morre de medo dos Yankes, a minha deportação seria rápida e precisa. Todo governo tem um enorme medo, ao ver seu poder ameaçado. Em todo mundo é assim. Testemunhas confiáveis que dão depoimentos verdadeiros sobre coisas excepcionais, são taxadas de loucas. Ou acredito que podem ser até exterminadas, pelo simples fato de saberem um segredo dessa importância. Em resumo, o meu sossego acabaria de uma forma abrupta e radical. Eu era suficientemente inteligente para saber todas essas coisas. E lia os jornais. Jamais iria falar, mesmo que enfrentasse problemas. E já estava acostumado com eles. A tarde chegava rápida, com o sol se escondendo de vez em quando, atrás de nuvens cinzentas. Elas tomavam conta do horizonte embaçado pela poluição, limitado pelas silhuetas dos prédios. Era dia de Eliza vir. Arrumei a cama, e fiquei esperando, fazendo um monte de conjecturas sobre viagens e aventuras radicais. Quando ela chegou, conversamos bastante como sempre, mas nesse dia estava torcendo para ela não ir embora. Depois de minhas descobertas, fiquei receoso de ficar só em casa. Ainda não tinha explicação para tudo aquilo. E coisas desconhecidas nos dão medo. Uma boa companhia sempre era útil e agradável. Útil porque ela limpava a casinha com a maior facilidade, coisa que só as mulheres sabem fazer. Agradável pela companhia e pelos carinhos que ela me dispensava. Agradei-a bastante para ficar. Ela assentiu e passamos uma noite normal. Às vezes acordava e verificava bem se estava mesmo em meu quarto. Outras noites que passei só, dormi na sala. “O seguro morreu de velho”, dizia o ditado. Logo chegou o sábado e iria aproveitar o dia de folga para fazer mais experimentos. Levantei cedo e vi que o dia estava claro e bonito. Depois de algumas horas, resolvi fazer a viagem. Fechei a casa para não ser incomodado e peguei o controle. Me sentei de comprido na cama com as costas na cabeceira. Senti um gostoso aroma de flores. Lembrei que o limoeiro estava florido, no meio de um festival de abelhas e beija-flores. Era a resposta que ele me dava pelo cuidado que eu dispensava. Apertei o meio do controle, para ligá-lo. Senti a pequena vibração. Esperei um minuto e apertei o triangulo da direita. Veio o clarão e senti um tremor no corpo todo. Vi-me em cima da cama na mesma posição. E ela estava bem no meio de uma rodovia. Senti o perigo imediatamente e rapidamente saltei fora e a puxei para o acostamento, fazendo grande esforço, não pelo peso, mas pela dificuldade dos pés enroscarem nas depressões. Naquele momento não passava nenhum veiculo, mas já ouvia a aproximação. A cama era toda de metal, mas seu peso não correspondia ao tipo de material. Julgava eu que talvez fosse um metal alienígena, bem leve e resistente. Fora do perigo comecei a analisar onde estava.
Sosseguei e sentei, esperando que algo acontecesse. No horizonte que seguia a estrada, dava para ver ao longe, contornos opacos dos edifícios de uma cidade. O sol estava agradável e no azul do céu passavam rápidos, pássaros,em um vai e vem interminável. Deviam ser andorinhas. Uma brisa quase fria soprava insistente, trazendo odores de lugares distantes. Logo apareceu um carro vindo rapidamente e seguindo em direção da cidade. Depois de ter passado uns trezentos metros, parou. Após alguns minutos voltou em marcha-ré, devagar até emparelhar comigo sentado na cama. O veiculo era de formas arredondadas e de cor clara. Não dava para distinguir os vidros e as rodas ficavam escondidas. Emitia um chiado baixo e constante. Saiu do veiculo um individuo ainda moço, com cara de curioso. Tinha uma boa aparência. O vento agitava seus cabelos claros, tapando de vez em quando seus olhos. Sem cumprimento algum, olhou para mim com cara de amigo e disse, com forte sotaque:- --- O que é isso onde você está sentado?
----É uma cama. ----Respondi, esboçando também uma cara de amigo.
----Cama? Nunca vi uma assim.
----É muito antiga. ----Afirmei... Aproveitando a simpatia do sujeito, formulei uma pergunta: ---Diga-me uma coisa... Em que ano estamos?
----Você não sabe? ---Indagou surpreso, abrindo a boca.
----É que eu tive um problema de amnésia e perdi um pouco a noção do tempo. ----Respondi tentando não falar muito, para não ter que dar explicações.
----Estamos em 2080. ----Fiquei frio por um momento e disfarçando um pouco, completei com cara de tonto:

----Há bom... Obrigado. ----Como ele foi se aproximando cada vez mais para talvez tocar na cama, achei por bem dar o fora dali. Apertei o controle na parte de cima. No minuto seguinte estava em meu quartinho acolhedor. 

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