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Depois
de algum tempo cheguei a algumas conclusões práticas. Ficando fora
da cama para não ser envolvido, fui acionando o controle e vendo as
reações. O triângulo do meio ligava o sistema. O da direita
parecia que mandava o tálamo com quem estivesse em cima para o
futuro. O da esquerda para o passado. E o de cima, retornava ao ponto
zero, ou para o presente. No dia seguinte faria outra viagem, mesmo
com um medo danado de se perder nas dobras do tempo. Pensava comigo
que simplesmente “sumiria” e seria um caso insolúvel, como diz a
policia. Sumir... Aquela palavra parece que queria se fixar de alguma
forma em meus pensamentos, mas desviei a atenção para outras
possibilidades. Pensei no imenso leque de opções. Estava ali a
minha frente à melhor agenciadora de viagens que existia.... tudo
grátis, livre das garras do capitalismo, mesmo que o risco fosse por
conta do viajante. Peguei o controle e escondi-o no guarda-roupa.
Temia que ao estar na cama pudesse ser acionado acidentalmente. Já
pensou acordar outro dia junto com os leões? Se desse tempo de
acordar. Por outro lado queria guardar o máximo de segredo daquilo
tudo. Nem para Eliza, contaria. Razões para fechar a boca existiam
aos montes. Se alguém soubesse, em pouco tempo cercariam minha casa,
certamente levariam a cama a um lugar secreto. As noticias seriam
bloqueadas e o mínimo que saberiam de minha pessoa era que estava
envolvido com drogas ou coisa parecida, ou pior ainda, suspeito de
ser um terrorista. Daí o governo dos EUA mandaria uma ordem ,
sugerindo que me deportassem para lá. Como o nosso governo quase
morre de medo dos Yankes, a minha deportação seria rápida e
precisa. Todo governo tem um enorme medo, ao ver seu poder ameaçado.
Em todo mundo é assim. Testemunhas confiáveis que dão depoimentos
verdadeiros sobre coisas excepcionais, são taxadas de loucas. Ou
acredito que podem ser até exterminadas, pelo simples fato de
saberem um segredo dessa importância. Em resumo, o meu sossego
acabaria de uma forma abrupta e radical. Eu era suficientemente
inteligente para saber todas essas coisas. E lia os jornais. Jamais
iria falar, mesmo que enfrentasse problemas. E já estava acostumado
com eles. A tarde chegava rápida, com o sol se escondendo de vez em
quando, atrás de nuvens cinzentas. Elas tomavam conta do horizonte
embaçado pela poluição, limitado pelas silhuetas dos prédios. Era
dia de Eliza vir. Arrumei a cama, e fiquei esperando, fazendo um
monte de conjecturas sobre viagens e aventuras radicais. Quando ela
chegou, conversamos bastante como sempre, mas nesse dia estava
torcendo para ela não ir embora. Depois de minhas descobertas,
fiquei receoso de ficar só em casa. Ainda não tinha explicação
para tudo aquilo. E coisas desconhecidas nos dão medo. Uma boa
companhia sempre era útil e agradável. Útil porque ela limpava a
casinha com a maior facilidade, coisa que só as mulheres sabem
fazer. Agradável pela companhia e pelos carinhos que ela me
dispensava. Agradei-a bastante para ficar. Ela assentiu e passamos
uma noite normal. Às vezes acordava e verificava bem se estava mesmo
em meu quarto. Outras noites que passei só, dormi na sala. “O
seguro morreu de velho”, dizia o ditado. Logo chegou o sábado e
iria aproveitar o dia de folga para fazer mais experimentos. Levantei
cedo e vi que o dia estava claro e bonito. Depois de algumas horas,
resolvi fazer a viagem. Fechei a casa para não ser incomodado e
peguei o controle. Me sentei de comprido na cama com as costas na
cabeceira. Senti um gostoso aroma de flores. Lembrei que o limoeiro
estava florido, no meio de um festival de abelhas e beija-flores. Era
a resposta que ele me dava pelo cuidado que eu dispensava. Apertei
o meio do controle, para ligá-lo. Senti a pequena vibração.
Esperei um minuto e apertei o triangulo da direita. Veio o clarão e
senti um tremor no corpo todo. Vi-me em cima da cama na mesma
posição. E ela estava bem no meio de uma rodovia. Senti o perigo
imediatamente e rapidamente saltei fora e a puxei para o
acostamento, fazendo grande esforço, não pelo peso, mas pela
dificuldade dos pés enroscarem nas depressões. Naquele momento não
passava nenhum veiculo, mas já ouvia a aproximação. A cama era
toda de metal, mas seu peso não correspondia ao tipo de material.
Julgava eu que talvez fosse um metal alienígena, bem leve e
resistente. Fora do perigo comecei a analisar onde estava.
Sosseguei
e sentei, esperando que algo acontecesse. No horizonte que seguia a
estrada, dava para ver ao longe, contornos opacos dos edifícios de
uma cidade. O sol estava agradável e no azul do céu passavam
rápidos, pássaros,em um vai e vem interminável. Deviam ser
andorinhas. Uma brisa quase fria soprava insistente, trazendo odores
de lugares distantes. Logo apareceu um carro vindo rapidamente e
seguindo em direção da cidade. Depois de ter passado uns trezentos
metros, parou. Após alguns minutos voltou em marcha-ré, devagar até
emparelhar comigo sentado na cama. O veiculo era de formas
arredondadas e de cor clara. Não dava para distinguir os vidros e as
rodas ficavam escondidas. Emitia um chiado baixo e constante. Saiu
do veiculo um individuo ainda moço, com cara de curioso. Tinha uma
boa aparência. O vento agitava seus cabelos claros, tapando de vez
em quando seus olhos. Sem cumprimento algum, olhou para mim com cara
de amigo e disse, com forte sotaque:- --- O que é isso onde você
está sentado?
----É
uma cama. ----Respondi, esboçando também uma cara de amigo.
----Cama?
Nunca vi uma assim.
----É
muito antiga. ----Afirmei... Aproveitando a simpatia do sujeito,
formulei uma pergunta: ---Diga-me uma coisa... Em que ano estamos?
----Você
não sabe? ---Indagou surpreso, abrindo a boca.
----É
que eu tive um problema de amnésia e perdi um pouco a noção do
tempo. ----Respondi tentando não falar muito, para não ter que dar
explicações.
----Estamos
em 2080. ----Fiquei frio por um momento e disfarçando um pouco,
completei com cara de tonto:
----Há
bom... Obrigado. ----Como ele foi se aproximando cada vez mais para
talvez tocar na cama, achei por bem dar o fora dali. Apertei o
controle na parte de cima. No minuto seguinte estava em meu quartinho
acolhedor.
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