Literatura - 18.O tálamo...

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Eliza tinha marcado com o homem um encontro para a noite. Chegara o grande dia. Era um domingo e estávamos preparados para cada um encenar o seu papel. Eliza iria fazer a maior e mais difícil parte, que era trazer o individuo para casa. Eu fiquei esperando e na hora prevista para eles chegarem sai para o quintal e fiquei olhando o céu frio e estrelado. Sentei-me ao lado do pequeno tanque de lavar roupa e esperei. Ouvi a fala da moça que vinha chegando. Quando escutei o ruído da fechadura, procurei me esconder melhor e ficar mais atento ao sinal combinado. Ela entrou com o individuo e se dirigiram para o quarto, sempre conversando. Entre amassos e beijos (que eu imaginei)ela o fez sentar-se na cama, tirando inicialmente seu paletó e colocando na cadeira. Em seguida, sugeriu uma bebida e foi até a cozinha. Acendeu a luz, clareando um trecho do pequeno quintal. A luz passava pelo vidro da janela sem cortina, formando um retângulo esticado no chão, lá fora. Quando entrei silenciosamente ela já estava de saída pela porta da rua, e fez um sinal com a cabeça, que tudo estava indo bem. Dali para frente à coisa era comigo. Com a arma na mão entrei no quarto e deparei com o Aristides deitado de costas na cama, bem à vontade, esperando a volta da garota. Quando me viu levou um susto tão grande e sentou-se. Falei baixo e devagar para não assustá-lo muito e provocar algum movimento repentino. Eu mesmo procurando ter muita calma, disse:
----Fique quieto e não saia daí. ---disse apontando o cano para ele.
----O que é isso?----É um assalto?
---Não é não... É apenas uma conversa que há muito tempo gostaria de ter. Fique calmo que nada de ruim acontece.
----A... Eu conheço você...me lembrei .Vai me matar? Olha se eu prejudiquei você, nada foi pessoal. Obedecia ordens.
----Você não me prejudicou... Acabou com a minha vida.
----Olha, sinto muito. Mas somente o despediram da empresa.
---Não... Além disso você também tomou minha mulher. Lembra-se da Beatriz?
---Puxa, mas eu não sabia que era sua mulher. ----Disse fazendo cara de inocente, mas por trás da cortina de seus olhos, um terror crescente, de ser ali eliminado, tomava forma e o desespero já era perceptível, embora ele tentasse disfarçar. Ali estava em minhas mãos o homem que arruinou minha vida. Deveria deixá-lo viver?Uma duvida pairava entre duas ideias em minha cabeça. Que iria fazer?
Apertei o controle e veio o clarão ofuscante. Em segundos, o lugar da cama estava vazio. Agora era só dar um tempo e trazer a cama de volta. Fui até a sala e me sentei. Estava cansado mentalmente e aquilo transferia para o meu corpo todo um marasmo de dores e dificuldade para respirar. Eu não estava satisfeito comigo mesmo. Foi totalmente o contrario do esperado e aconteceu tão depressa. Mas se tivesse deixado ir, certamente ele iria a policia, me denunciar por sequestro. Eliza também se envolveria. Seria um problema geral. Se isso acontecesse, daí era eu e a moça que teríamos um enorme pepino pela frente. Não queria ter envolvimento com a justiça corrupta, onde só quem tem dinheiro se safa. Não... admiti...estava bom daquele jeito. Teria que ser assim mesmo. Mas o que deveria ser uma festa de vitoria e satisfação veio como uma leve agonia e logo traduzi que no fundo de meu ser, não queria causar nenhum mal ao individuo. O ódio que cultivava, sem eu perceber, com o tempo foi-se desgastando e ficando cada vez menor. Ele tinha razão...ser despedido de uma empresa não é o fim do mundo para quem tem garra e coragem. No caso de minha mulher, certamente se não fosse ele, seria outro. E quem me daria certeza que ela já não saia com outros antes dele? Então a culpa era somente dela. Agora tinha percebido que fizera uma coisa tola. Depois de duas horas com esses pensamentos, resolvi trazer a cama de volta, na esperança de ele vir junto. Se ele voltasse iria me desculpar e o despedir de uma forma bem mais nobre do que agira. Mesmo que depois houvesse represália da parte dele. Fui ate o quintal e da janela do quarto, como fizera no episodio das feras, acionei o tálamo de volta. Não poderia me arriscar como de outra vez. A cama voltou só. Fiquei um pouco angustiado e resolvi esperar o desenrolar dos acontecimentos. Dali a pouco Eliza telefonou preocupada. Tinha certa apreensão em suas palavras.
----PG? O que aconteceu!Tudo bem por ai?
----Aqui tudo bem... Nada aconteceu de anormal.
----E o Aristides?
----Depois de uma boa conversa, foi-se embora. ----Tentei justificar sem muito sucesso. Eu percebia na voz e nas palavras dela, uma desconfiança de tudo aquilo.
---- Me esqueci de dizer uma coisa, e não deu tempo mesmo, mas ele deixou o carro na esquina de cima. ---Um frio percorreu minha espinha.

----Está certo... Mas agora isso não tem importância. ---Completei com uma voz, para mim, firme e decisiva. Mas minha cabeça imediatamente começou a elaborar um plano, de tirar o veiculo dali.

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