Sou um bandido !!




















'Sou um bandido', diz a Lula ex-preso cubano que vive no Brasil.
Em entrevista, presidente comparou presos comuns a dissidentes
políticos para criticar greve de fome.

José Maria Tomazela - o Estado de S. Paulo .

SOROCABA - O presidente do Projeto dos Grandes Primatas
(GAP) internacional, o microbiologista Pedro Ynterian, que foi
preso em 1961 pelo regime de Fidel Castro em Cuba, reagiu à
declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que comparou
a situação de presos políticos naquele país à de presos comuns
no Brasil.


A uma agência internacional, Lula disse que a greve de fome não
pode ser utilizada como pretexto para libertar pessoas em nome
dos direitos humanos, e que as determinações da Justiça e do
governo de deter pessoas em nome da legislação de Cuba
devem ser respeitadas.


Em carta aberta divulgada ontem (12) com o título "Eu sou
um bandido!", Ynterian diz que é um ex-prisioneiro político e
considera "um insulto" comparar a condição dos criminosos
que lotam as prisões paulistas com a de presos políticos como
o cubano Orlando Zapata, que morreu após 85 dias
de greve de fome.


Empresário naturalizado brasileiro, Ynterian está no País há
mais de 35 anos, construiu e mantém em Sorocaba um
santuário especializado em chimpanzés e se tornou um
ambientalista respeitado internacionalmente.


Ele sempre evitou falar de seu passado de lutas pela
democracia em Cuba, mas, depois da declaração do presidente,
disse que, se ficasse calado, estaria "traindo a memória" dos
dissidentes cubanos que morreram lutando contra a ditadura
castrista.


"Desde os 16 anos lutei contra a ditadura de Batista
e anos depois tive que lutar contra a dos irmãos Castro,
amigos fraternos do nosso presidente."


Ele conta que, logo após a tentativa frustrada de invasão da
Baía dos Porcos pelos exilados cubanos, numa ação organizada
pelos Estados Unidos, Fidel Castro passou a perseguir e
prender os opositores.


"Eu era secretário geral da Federação de Estudantes Católicos
de Cuba, com três universidades e dezenas de colégios. Todas
as universidades e escolas foram fechadas e ocupadas pelo
regime ditatorial e nunca mais o ensino privado existiu. Eu
não peguei em armas, mas tinha opinião contrária ao que Fidel
estava fazendo, e para eles isso bastava."


Ynterian passou algumas semanas na prisão de Cabana,
dirigida por Ernesto Che Guevara, e viu vários companheiros
estudantes, muitos apenas garotos, serem mortos. "Também
presenciei a morte do comandante Humberto Sori Marin,
que redigiu a primeira lei de Reforma Agrária quando lutava
na Serra Maestra, junto com os irmãos Castro, e depois lutou
contra a ditadura implantada por eles.


Todos aqueles fuzilados no Paredão da Cabana nunca tiveram
um julgamento, um advogado de defesa, nem puderam falar
sua verdade. Isso se repetiu centenas, milhares de vezes."


O ambientalista espera que um dia a história "terrível e
tenebrosa da Cuba castrista" seja conhecida pelo mundo.
Ele acredita que Lula sabe o que acontece em Cuba, mas

insiste em fazer comentários positivos sobre Fidel Castro para
agradar a esquerda internacional. "Ele quer ficar bem com a
esquerda e a direita, mas acaba dando um tiro no pé." Para ele,
os dissidentes cubanos em greve de fome são mártires.


"Eles passaram pelas piores torturas e sobreviveram, mas
agora querem dar um recado ao mundo que, se ninguém fizer
nada, aquilo não vai mudar."


Ynterian conta que só escapou do fuzilamento por ter sido solto
por engano. "Tinha muita gente presa e eles perderam o
controle. Logo depois de me soltar, foram atrás de mim, mas
me refugiei na embaixada brasileira. Sou um sobrevivente.

" A embaixada do Brasil em Cuba tinha, na época, um acordo
com os Estados Unidos pelo qual o governo americano recebia
os exilados que tivessem visto, como era seu caso. Depois de
quatro semanas na embaixada, ele foi para os Estados Unidos,
onde passou a trabalhar. Em 1973, a empresa o mandou
para o Brasil.


Ele se considera "humilhado" pela declaração de Lula, que o
condenou sem o conhecer e sem que pudesse se defender,
mas não acha que sua carta vá fazê-lo mudar de posição.


"O Lula não vai reconhecer que errou grosseiramente, mas
acho que vai se cuidar mais antes de falar no futuro. Ele acabou
prestando um desfavor ao Castro, pois a repercussão mundial
favoreceu a causa dos dissidentes."

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