16 de novembro de 2011
'Occupy' seu quintal
Não há desculpa: sempre dá para fazer roça em casa, nem que seja um canteiro de ervas. 'Roceiros urbanos' ensinam a comer bem, se divertir e preservar o ambiente plantando - e até criando cabras e abelhas - em espaços pequenos.
Jornal, O Estado de São Paulo
Janaina Fidalgo
Morar em uma cidade grande e dispor de um ínfimo pedaço de terra e de pouco tempo livre não são empecilhos para uma turma que retomou uma das mais primitivas atividades desde que o homem deixou de ser nômade e coletor: o cultivo e o preparo de alimentos para o próprio consumo.
Os Dervaes. Os irmãos Justin, Anaïs e Jordanne ajudam o pai, Jules, a tocar o projeto Urban Homestead em Pasadena, nos EUA, não são agricultores, no sentido estrito da palavra, porque não dependem diretamente da terra para sobreviver nem moram em áreas rurais.
São, digamos, sitiantes urbanos cada vez mais independentes. Cultivam verduras, legumes e frutas em pequenos espaços de terra na cidade. Criam abelhas, galinhas e coelhos.
Alimentam fermentos naturais e assam os próprios pães. Fazem geleias, iogurte, caldo e embutidos. Buscam a segurança de saber exatamente onde e como foi produzido o que eles e a família vão comer e também o prazer de trabalhar com as mãos - e não há como negar o viés político-ideológico que move alguns.
Em Pasadena, Califórnia, uma família transformou há mais de 20 anos uma casa comum de cidade num sítio urbano onde produz 3 toneladas de alimentos orgânicos por ano.
Jules Dervaes e os três filhos - Justin, Anaïs e Jordanne - plantam tomate, moranga, feijão, verduras, maçãs, mirtilo, goiaba, morango, laranja e ervas.
"Comida cultivada em casa é muito superior em sabor e nutrientes do que a que vem do supermercado.
Além disso, não é mais saudável só para você, mas também para o ambiente. Plantando localmente, você reduz sua pegada ecológica", diz Jules em entrevista ao Paladar.
O projeto de cultivo caseiro que Jules batizou de Urban Homestead (sítio urbano) supre as necessidades da família direta e indiretamente.
Eles se alimentam do que plantam, compartilham a produção com amigos e familiares e vendem o excedente da colheita a restaurantes e moradores de Pasadena para comprar o que não conseguem produzir em casa, como açúcar, arroz e farinha de trigo.
"Quando comecei não havia modelos bem-sucedidos para copiar. Tudo que eu tinha em mente eram as grandes fazendas. Transportar esses modelos para meu reduzido espaço custou muito trabalho físico e mental.
Nosso sucesso veio de tentativas e erros - e muito suor." O projeto não é só de cultivo e de criação de animais para produção de ovos, leite e mel.
Inclui práticas ecológicas, como compostagem de resíduos orgânicos, uso de energia e fornos solares e de equipamentos movidos a manivela e a pedal, reúso de água e até produção de biodiesel.
O Urban Homestead deu tão certo que virou até um premiado curta-metragem, Homegrown Revolution, em que a família compartilha a experiência; e Jules, sua filosofia: "Cultivar alimentos é uma das ocupações mais perigosas da face da terra. Porque você corre o risco de se tornar livre".
"Todo mundo pode fazer algo com o que tem. Você só precisa aprender o comportamento do ambiente. Sempre encorajo as pessoas a aprender práticas antigas e a pesquisar como as gerações pioneiras sobreviviam", diz.
Também na Califórnia, no Vale do Napa, a enóloga Heather Munden cria abelhas, planta vegetais em pequenos canteiros, faz pão em fogão a lenha e mata porcos para preparar embutidos. "Não precisa muito para plantar a própria comida, é só usar bem o terreno", diz ao Paladar.
Aqui no Brasil, três casais amigos vivem há quase dois anos a experiência de conciliar a rotina de profissionais liberais com a prática da agricultura e pecuária urbanas.
Mudaram para a mesma rua, num condomínio de classe média alta em Curitiba, e alugaram um terreno rodeado por prédios onde plantam e criam galinhas, coelhos e cabras.
"Quem disse que a gente não pode voltar a ser responsável por 60 a 70% da nossa comida? Não vamos produzir tudo que precisamos, mas quanto mais gente tivermos na nossa network, menos vamos precisar do supermercado", diz Claudio Oliver, da Casa da Videira.
Em São Paulo, na Lapa, a blogueira Neide Rigo não deixa descoberto nem um pedacinho de terra, seja nas praças do bairro ou nos muito bem aproveitados 12 m² de seu quintal.
Nele, tem ervas, verduras, frutas e legumes. Fora as abelhas indígenas, os pães e uma porção de alimentos que faz.
"É preciso começar. Plantar, colher e fazer comida são coisas que estão no inconsciente coletivo.
É instintivo e fazem parte da nossa sobrevivência."
Assista e leia. Você pode ver o premiado documentário sobre a família Dervaes no YouTube (escreva no campo de busca "homegrown revolution"). Para conhecer melhor o projeto, visite o urbanhomestead.org.
E para saber mais sobre o projeto da comunidade autossustentável de Curitiba visite o site mantido pelo grupo: casadavideira.com.br
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